“Era ainda o inicio da canoa polinésia no Brasil, ano de 2005. Estava aprendendo a fazer Leme, tinha experiência no mar basicamente com o surf, e naquele tempo isso era importante para a leitura do mar. Ainda é.
Saímos para uma remada e ao chegar na boca da barra, o meu professor da época fez para sair da baia de Guanabara. Tudo o que eu queria na verdade.
Contudo, ao virarmos o canal, tudo mudou. O mar estava enorme e não dava para voltar naquele ponto, na saída do canal. Pedi que todos remassem lá para fora e de lá a gente ia ver. Tinham ondas realmente grandes, quebrando no meio do canal, o que voltei a ver pouquíssimas vezes depois. Fomos e aí talvez o fato de surfar tenha ajudado muito. Contei as series, e então percebi um intervalo para voltar. Remamos sem olhar para trás e entramos de volta nas águas abrigadas de Niterói.
Ao chegar em terra um dos remadores beijou a areia e disse que nunca mais entraria no mar de novo. E nunca mais entrou.”
Caros amigos leitores, voltamos a nossa coluna Mestre do Mar com esse relato de uma situação que vivi a muitos anos atrás, mas que marcou demais até onde ir.
Quando cheguei na areia e vi o pânico no olho daquele remador, e ao mesmo tempo o alivio de ter chegado salvo em terra, aquilo me deixou uma grande lição: Meu direito de adrenalina acaba no inicio do desconforto de alguém dentro do mar, não só na canoa.
O próximo passo do desconforto é o medo, e do medo o pânico. E todos concordam que sentir pânico nunca foi e nunca será agradável.
E o que define esse limite?
Depois dessa situação muitas águas se passaram e cada dia tento ser mais cauteloso. A primeira coisa que define o limite de onde se ir é sua tripulação, seu time.
Passar uma situação de quebra de uma canoa em uma prova com todo o apoio é totalmente diferente da mesma situação em um dia rotineiro de aula com alunos.
E quanto mais se ousa, mais se tem que ter certeza das habilidades da tripulação em caso de necessidade, quais recursos a equipe possui, e uma coisa muito importante que o mestre dos mares Alemão de Maresias sempre fala, a AQUACIDADE.
Em uma aula, muitos alunos dizem que sabem nadar quando na verdade não sabem. As vezes penso que no VA`A poderia haver um protocolo de primeira aula. Ora, ninguém gosta de se molhar as 05:00 da manhã, e se um clube exige algo disso e o outro não, o aluno iniciante provavelmente procurará aquele que facilite. Se todos passarem a adotar isso como regra, não haverá escolha e certamente o nível de segurança das aulas aumentaria exponencialmente.
Essa vergonha de assumir falta de habilidades trás inúmeros riscos a todo um grupo, e se torna necessário afirmar constantemente que no mar o medo não é uma vergonha, mas sim uma virtude. Ele salva vidas literalmente.
Portanto, conhecer a sua tripulação normalmente demanda tempo, as suas habilidades em caso de estresse, seu preparo físico e psicológico para adversidades no mar.
A sua rota estará diretamente ligada a tripulação, e especialmente por aquele que não se sente seguro.
Outro ponto que define até onde ir é quem está conduzindo uma embarcação. O Leme em conjunto com o capitão.
Havia um gráfico no Havaí que mostrava algo como o Aquilo que o remador acha que sabe em escala de 1 a 10 em anos, e aquilo que ele realmente sabe ao passar dos anos. E é interessante porque quando se chegava aos 2 anos de pratica, o remador achava que sabia algo como 10, quando na verdade ele sabia 2. Isso igualava a partir de 10 anos quando o que ele sabia era condizente com aquilo que ele realmente sabia. E a partir daí o gráfico invertia, o que ele sabia começava a ser maior do que aquilo que ele achava que ele sabia.
Claro que há exceções a essa regra, mas de um modo geral isso vale sim. É o tempo médio para uma faixa preta na maioria dos esportes, ou seja, uma conquista depois de muito esforço.
Não tem como uma pessoa com 2, 3 anos de Leme querer fazer – e fazer- coisas que Lemes que estão anos fazendo e que se tornaram totalmente instintivas, lidar com situações adversas de uma forma totalmente controlada e segura, e com certeza sabendo a hora de voltar. Na maioria das vezes além de todo o cenário, com o tempo o sexto sentido se torna aguçado, sente-se que algo te manda voltar, e todas as vezes que se vai contra esse sexto sentido dá problema.
Essa maturidade de entender que o mar bloqueia evita muitos desgastes e por consequência salva vidas também. É ir até onde se preparou e expandindo os limites com consciência, um pouco de cada vez.
Assim, outro ponto que define até onde ir seria a maturidade do leme, em termos de habilidades físicas e emocionais.
Conhecer os equipamentos e como se safar em caso de necessidade faz parte de todos que querem singrar o mar.
Muitos fazem uma amarração de um jeito porque um dia alguém falou. Ora, e se precisar usar outro material, outra forma? E se tiver que fazer isso no mar, com ondas?
Inicialmente aprendi a amarrar a canoa com borracha, e os Iacos com cabo.
Um belo dia comecei e me questionar que eu não tinha habilidade necessária se aquela borracha estourasse e eu precisasse parar em uma praia que tivesse um cabo, um cipó. E aquela constatação me incomodou muito.
E comecei a pegar cabos e amarrar de vários jeitos. Em contrapartida amarrar os Iacos com a borracha, saí invertendo tudo, testando.
Esses treinos já me tiraram de algumas situações. Em mares maiores os cabos podem afrouxar e ter que amarrar ali no meio do salseiro não é das tarefas mais triviais. Mas é possível se treinado.
Um simples laço de reboque tem que ser estudado em terra. E em uma Oc6 será de um jeito, em uma V6 de outro, em uma V1 de outro. Além de tipos de cabos diferentes demandam cuidados diferentes, um cabo fino pode danificar uma canoa muito mais facilmente do que um cabo de nylon na hora do reboque.
Tentar usar remo como Iako, para substituir um Iako quebrado…
São muitas situações que podem dar errado em um simples percurso não necessariamente no longo, mas um curto que se esteja a 5km da costa com corrente contra e algo dá errado, já se torna complicado.
Para finalizar conhecer os elementos da natureza.
Hoje muitos tem conhecimento baseado nos gráficos de previsão. Como o próprio nome já diz, trata-se de previsão e não de acertação. Esses gráficos pegam todo o movimento da atmosfera e mares e traduzem em uma simbologia para os usuários.
Contudo com o tempo pode se olhar para as nuvens, perceber o vento, sentir a temperatura da água.
Esses movimentos indicam o que acontecerá com maior precisão do que qualquer aplicativo pois trata-se do que acontecerá no micro clima que estamos inseridos.
E esse conhecimento é fundamental para ir, mas principalmente para saber a hora de voltar.
Esses são algumas das habilidades que se deve ter para ir pro mar e saber até onde ir. Para se avançar são necessárias outras inúmeras habilidades como estudos teóricos, contudo o principal de todos chama-se Tempo no Mar! Não apenas na canoa, mas no Mar. É ir de manhã e olhar para ver o que está acontecendo. É olhar para as estrelas, é saber que dia 20/03 será o dia que o sol nasce exatamente no Leste e morre exatamente no Oeste e ter isso na mente.
É respeitar a si mesmo e acima de tudo quem você está tendo a honra e o privilégio de conduzir em uma Canoa Polinésia ou em qualquer outra embarcação.
Aloha!
VAMOS JUNTOS QUE JUNTOS SOMOS MAIS FORTES!!!
MAIS IMPORTANTE QUE O IR SERÁ SEMPRE O VIR!
ALOHA!
Douglas Moura
Remador e mestre amador.
Instagram: aloha_douglas_;
Facebook: Douglas Moura
Douglas conta com os apoios – @Evoke eyeswear; @PuroSuco.oficial;@RaldreiNatividade fisioterapia esportiva; @Rpilates; @AcademiaNiteroiSwim; @IcarahyCanoa;
Além disso, desenvolve treinamentos focados em navegação segura.
.Minha relação com o mar sempre foi de admiração…desde pequena via séries sobre o mar, recifes, corais, era aficcionada pelos documentários de Jaques Cousteau, mas sempre tive medo.. tive aulas de natação em piscinas mas era aquela nadadora que fica colada na borda..rsrsrs..os anos passaram e há cerca de 5 anos sou praticante de canoa havaiana.Tive até a oportunidade de fazer 02 aulas com vc , de leme.. Sempre uso colete e dificilmente saio da canoa qdo paramos em algum “point” Achei que já era hora de aprender a nadar em águas abertas e aos 58 anos me inscrevi numa equipe, na praia vermelha. A professora me perguntou meu objetivo e disse que queria chegar na primeira bóia e voltar rsrsrs ..logo na primeira aula, já que a praia é de tombo..meu companheiro(medo) se manifestou!! Fui dialogando e argumentando com ele.. e há cerca de um mês fiz minha primeira travessia!!! Do leme à praia vermelha!! Levei duas horas..fui a última a completar!! E assim sigo aprendendo e admirando cada vez mais o mar😊